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Читаем вместе – Sexta-feira treze – Татьяна Белинке

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Читаем вместе – Sexta-feira treze – Татьяна Белинке

Ganhei um guarda-chuva de presente. Daqueles modernos para a época, muito chiques, dobráveis, que ficam pequenininhos e cabem na bolsa. E fiquei meses sem usá-lo. Mesmo porque não chovia em São Paulo há muito tempo.

Mas naquela sexta-feira o céu ameaçava chuva. Ou melhor, não ameaçava, prometia, já que todo mundo estava desejando chuva mesmo. E eu resolvi estrear o meu guarda-chuva novo.

Na Rua Sete de Abril, com efeito, começou a chover. Subi no degrau de uma entrada de prédio e me dispus, meio temerosa, a abrir o meu guarda-chuva dobrável – mas, antes mesmo de eu fazer a primeira tentativa, no momento exato em que tirava a elegante capinha do meu lindo guarda-chuva amarelinho, um homem parou na calçada, bem na minha frente, e se plantou, de braços cruzados, a me olhar bem na cara, à espera dos acontecimentos.

O homenzinho merece uma descrição: era o tipo clássico do vagabundo bem-humorado, barba de quatro dias, chapéu de feltro desabado, daqueles que há muito tempo já perderam a tita e a forma, cachecol comprido pendurado no pescoço, sapatões de boca de jacaré pedindo comida: um personagem saído diretamente de algum filme francês de ‘cinema-verdade’.

Mas, como ia dizendo, o tal personagem cruzou os braços, plantou-se na minha frente e desafiou:

– Quero ver a senhora abrir isso;

Sem responder, com muita dignidade, abri o guarda-chuva. Isto é, pensei que abri. Porque ele se abriu, mas em zigue-zague – metade para baixo, metade para cima, que nem árvore de Natal! O meu espectador riu de gosto.

Eu, como todo o espírito esportivo, dei um sorriso e tentei de novo. Não funcionou outra vez.

– Insiste – disse o homem – não desista.

Eu nem tencionava desistir. Com todo o cuidado, fiz uma espécie de pontaria. E tentei outra vez. Qual o quê! O raio do guarda-chuva tornou a negar fogo.

A minha torcida torcia-se, mas era de rir. E, agora, começou a juntar gente. Parou mais um rapaz, dois outros homens e um menino. Tudo esperando que eu abrisse o guarda-chuva.

– Mais uma vez, dona! – encorajava-me o meu conselheiro. – Calma! Não se afobe!

O meu sorriso já estava ficando da cor do guarda-chuva. Na quinta tentativa, eu já estava tão afobada que abri o bicho perto demais do meu rosto, e um dos ferrinhos (que viraram para cima, naturalmente) entrou direto na minha boca. A gargalhada foi geral. O meu show estava sendo um sucesso absoluto.  Só que agora, depois que eu quase furo um olho, o meu amigo mudou de cantiga:

– Desista, dona. Isso não vai abrir. Essas coisas nunca abrem.

Mas eu quiser tentar mais uma vez só de raiva. E, mais uma vez, falhei miseravelmente.

Aí disse o meu homenzinho:

Dona, por que a senhora não faz o que eu faço sempre nesses casos?

Olhei para ele com cara de ponto de interrogação.

– Pois é – continuou ele -, eu faço assim: quando as coisas não funcionam como eu quero, sabe o que eu faço? Eu quebro!

E concluiu, muito sério:

– Por que a senhora não quebra isso? A senhora é rica, pode!

E, nesse momento, o moleque que mora dentro de mim cassou-me a palavra e respondeu em meu lugar:

– Sabe duma coisa? Quebre o senhor!”

Meti o guarda-chuva na mão do perplexo vagabundo que me sobrava, seguida pelas gargalhadas dos espectadores. Já chovia bastante, e  eu entrei na primeira loja e comprei um guarda-chuva comum, preto e trambolhudo, que se abriu imediatamente.

E que me foi roubado do carro, na mesma noite, na porta da minha casa.

Não saio mais na chuva em sexta-feira treze.